Arte e feminismos no combate ao autoritarismo

O evento “Arte e feminismos no combate ao autoritarismo” foi um encontro para discutir possibilidades políticas e conexões afetivas em tempos difíceis, com foco na arte e feminismos como campos de resistência e diversidade. A programação teve a participação de ativistas, feministas, pesquisadoras, artistas e editoras, e o apoio do programa Cidade Queer (Lanchonete.org e Musagetes) e Jornal de Borda.

Além das três mesas de debate houve lançamentos do Jornal de Borda 3 e Ensaio 6 – “Por que não houve grandes mulheres artistas?” de Linda Nochlin, no .Aurora.

CONTEXTO

Neste exato momento, muitos artistas ocupam prédios da Funarte em cidades brasileiras. A reitoria da Unicamp está ocupada, e os secundaristas lutam pelo direito à educação. Entre as reivindicações dos que resistem está a volta da presidenta democraticamente eleita.

A primeira mulher presidente do país foi destituída do cargo em plena Conferência Nacional de Mulheres, momento em que se apontava a necessidade de criação do Sistema Nacional de Políticas para as Mulheres.

PROGRAMAÇÃO

11-13h / Combate 1: Ativismo, direitos sexuais e feminismos
Debatedorxs
Rita Quadros / ativista lésbica feminista
Jackeline Romio / ativista do feminismo negro
Mediação: Fernanda Grigolin / Jornal de Borda | Tenda de Livros

Rita Quadros falará da história das ações das mulheres lésbicas em políticas públicas, da caminhada lésbica e das Conferências de Mulheres. A presidenta Dilma Rousseff foi destituída do cargo no meio da 4a Conferência Nacional de Mulheres, onde 3 mil mulheres de todas as regiões do país discutiam proposições de políticas públicas.

Jackeline Romio conversará sobre as narrativas que envolvem o corpo e a violência contra a mulher negra. Abordará o feminicídio racista de Luana Reis, morta por policiais militares pelo simples fato de ser negra, lésbica e mulher. Jackeline falará do manifesto feminista negro e de mulheres trans, lésbicas e bissexuais, feito para protestar contra o assassinato de Luana. Falará também da obra Além dos quartos, o primeiro livro de arte erótica feminista negra do Brasil, que contou com 42 escritoras e onze desenhistas, incluindo uma franco-marroquina e uma franco-sudanesa.

13h-15h / Intervalo para almoço

15h-17h / Combate 2: Arte feminista, esfera pública: os anos 1964 e os anos 2016
Debatedoras
Fabrícia Jordão / pesquisadora nos temas arte e ditadura e processos coletivos em arte
Talita Trizoli / pesquisadora nos temas arte e feminismos.
Mediação: Julia Ayerbe / Edições Aurora | Publication Studio São Paulo

Fabrícia Jordão conversará sobre o fim do MinC e o pedido de a volta do Ministério. Caso fosse restituído o status de ministério, como não ser isca de legitimação e naturalização da agenda de um governo golpista? Teríamos condições de articular, desde o interior do aparelho de estado, algum tipo de resistência? Quais as possibilidades e limites dos artistas e intelectuais para intervir nos órgãos e políticas públicas em contextos de ilegitimidade política? Para pensar essas questões e o impasse que vivemos hoje, faremos uma conexão entre dois momentos históricos o da redemocratização, com a criação da Funarte, e o tempo presente, com a extinção do MinC.

Talita Trizoli falará da questão do feminismo na arte. Presente há cerca de meia década nas atividades e pesquisas de artistas, críticos e historiadores, há algum tempo tema recorrente no cenário brasileiro, devido tanto ao levante de grupos militantes de jovens feministas, como também a uma série de ataques e supressões de direitos representativos das ditas “minorias”. A fim de verificar se essa onda feminista no campo artístico advém de um efetivo envolvimento político da arte com a vida, ou se se trata apenas de mais uma captura mercadológica do sistema comercial da arte, propõe-se aqui apontar alguns dados históricos pertinentes para se compreender essa imbricada relação, e suas possibilidades críticas.

17h-18h / Combate 3: Jornal de Borda 03 e Ensaio 6 – “Por que não houve grandes mulheres artistas?”, de Linda Nochlin
Roda de entrevistas
Fernanda Grigolin / Jornal de Borda | Tenda de Livros
Julia Ayerbe / Edições Aurora | Publication Studio São Paulo
Laura Daviña / Edições Aurora | Publication Studio São Paulo

PARTICIPANTES

Rita Cerqueira de Quadros< é servidora pública municipal da Secretaria Municipal de Cultura da cidade de São Paulo, com graduação em Ciências Sociais. Feminista com atuação nos movimentos feministas e LGBT, ocupou a primeira cadeira do segmento de lésbicas e bissexuais no Conselho Nacional de Direitos da Mulher; participou do processo de construção das primeiras Paradas do Orgulho LGBT e das Caminhadas de Mulheres Lésbicas e Bissexuais.

Jackeline Romio é doutoranda e mestre em demografia pela Unicamp. Tem se dedicado ao estudo da violência contra mulher, feminicídios e desigualdades sociais de gênero e raça. Em 2013 fez parte do “Dossiê Mulheres Negras” da ONU Mulheres e IPEA, onde tratou da questão da vitimização de mulheres negras por agressão física no Brasil. Tem trabalho ativista com arte feminista negra junto ao coletivo Louva Deusas, foi idealizadora e editora de além dos quartos, o primeiro livro de arte erótica feminista negra do Brasil.

Cadu Oliveira é ativista LGBT e militante dos coletivos Revolta da Lâmpada e Cume, envolvido com ações de voluntariado desde 1996. Também fez parte da produção da Conferência [SSEX BBOX]. Tem MBA em Gestão de Pessoas pela Anhanguera, formado em Marketing e Vendas pela Universidade Anhembi Morumbi.

Fernanda Grigolin é artista visual, editora, pesquisadora, doutoranda em Artes Visuais na Unicamp. Por dez anos foi ativista de movimentos sociais no Brasil e na América Latina. Possui especialização em Direitos Humanos (USP) e é mestra em artes visuais pela Unicamp. É idealizadora do Jornal de Borda e da Tenda de Livros. Vive e trabalha entre Campinas e São Paulo.

Fabrícia Jordão é doutoranda na ECA-USP. Atualmente, como bolsista Fapesp, pesquisa as contribuições dos artistas e intelectuais para a institucionalização do campo das artes visuais e a consolidação de um campo discursivo, teórico e prático para a arte contemporânea durante a redemocratização brasileira.

Talita Trizoli é doutoranda em Educação e mestra pelo Programa Interunidades em Estética e História da Arte, com a dissertação Regina Vater. Por uma crítica feminista da arte brasileira. Bacharel e licenciada na área de Artes Visuais pela Universidade Federal de Uberlândia (2007), foi professora substituta na Faculdade de Artes Visuais e EAD da UFG, onde coordenou grupos de estudo e integrou atividades de pesquisa e extensão.

Júlia Ayerbe é bacharel em Ciências Sociais pela PUC-SP. De 2010 ao início de 2016 foi editora sênior da Pinacoteca do Estado de São Paulo. Atua como tradutora de espanhol e editora independente. É integrante de Edições Aurora / Publication Studio São Paulo.

Laura Daviña é bacharel em Artes Plásticas (Faap) com pós-graduação lato sensu em design gráfico (USP-Mariantonia), foi editora de arte na SM Edições e na revista Pesquisa Fapesp. Em 2013 juntou-se a um grupo de artistas inaugurando o espaço autônomo .Aurora, onde mantém e organiza a Edições Aurora / Publication Studio São Paulo.

ORGANIZADORES

Edições Aurora traz para o campo editorial produções visuais e escritas sobre arte e política numa perspectiva expandida. Situa-se no espaço autônomo .Aurora, onde se realiza sua produção e abriga eventos e debates como forma de estimular a vida social do livro e a reflexão acerca de temas que nos provocam. Desde 2015, integra a plataforma internacional Publication Studio, projeto com o princípio de produzir livros sob demanda, viabilizar a publicação e a disseminação pelo mundo de autores que acreditamos e admiramos.

Tenda de Livros é um projeto de circulação de livros que promove encontros, exposições, bate-papos. A Tenda vem de um pensamento que acredita que a cultura e a arte são ferramentas para serem usadas na criação de plataformas políticas e em novas formações de público.

Jornal de Borda é uma publicação semestral de arte, idealizada e editada por Fernanda Grigolin. O projeto gráfico é de Lila Botter. Borda conta com a colaboração de artistas, editores, curadores e pesquisadores. Cada edição gira em torno de um tema: a primeira foi sobre o ato de editar, a segunda aborda circulação da arte, e na terceira os eixos condutores foram feminismos, teoria queer e afrocentralidade. O Jornal de Borda está no limite do que seria um jornal: utiliza-se do formato, da rapidez e do texto curto, mas sem o caráter noticioso.

Cidade Queer é uma iniciativa de Lanchonete.org com a fundação Musagetes. O programa conta com diversas ações que se articulam pela relação entre queerness e a vida na cidade contemporânea. Vincula-se à ideia de direito à cidade, estabelecida pelo filósofo e sociólogo francês Henri Lefebvre. O objetivo é abrir discussões sobre a possibilidade de vivência na cidade fora de uma lógica normativa e que expandam o próprio conceito de queer, tendo São Paulo como perspectiva.

Janta #3 – O feminismo

O encontro “Janta – Comida Meliante, Política Meliante” desta edição teve como tema o feminismo. Discussões e trocas de experiência sobre a temática se deram de forma tranquila ao redor da mesa.

O encontro “Janta – Comida , Política ” desta edição teve como tema o feminismo. O jantar aconteceu no Casarão do Belvedere, na Bela Vista, e teve como anfitrião o ator Paulo Goya. Discussões e trocas de experiência sobre a temática se deram de forma tranquila ao redor da mesa.

Em diversos momentos do ciclo, surgiu o questionamento sobre onde estaria a discussão feminista em nossas atividades. Na edição #2 da Janta, usamos como referência um artigo de Hija de Perra em que ela cita o artigo de um autor publicado no livro “Por un feminismo sin mujeres”, organizado pela Coordinadora Universitaria por la Disidencia Sexual (CUDS). No texto de introdução deste livro, Jorge Díaz Fuentes diz: “Existe una apuesta política que como disidentes sexuales hacemos con el feminismo, con sus imbricadas formas, con un feminismo polisémico, amplio, un feminismo quimérico, donde encontrar nuestros espacios, siempre locales, abiertos a nuevas prácticas y manifestaciones de lo político de nuestros cuerpos, de nuestras interrupciones, que –como este circuito– nos posibilitó en rebeldía y compromiso.”

Ainda pesquisando sobre a ideia, apareceu nos resultados um artigo sobre a situação política brasileira chamado “Por um feminismo que vá além das mulheres”, escrito por Carla Rodrigues para um seminário sobre feminismo no Centro de Pesquisa e Formação do SESC. Nele, ela diz: “Para pensar sobre [qual seria o fato histórico com o qual as feministas do futuro irão identificar isso que estamos tentando fazer hoje], gostaria de retomar um dos debates propostos pela filósofa Judith Butler, que há 25 anos questionou a possibilidade de não mais fazer das mulheres o motor da política feminista. Se a partir dali parecia que ela anunciara o fim do feminismo, de fato suas provocações estavam apontando um paradoxo importante: de nada adiantava primeiro exigir das mulheres uma configuração estabilizada em uma identidade para depois pretender libertá-las. Era preciso, argumentava Butler, interrogar as próprias exigências de identidade. Tratava-se de poder pensar um feminismo que não seja feito em função de representar o “sujeito mulher”, o que exige uma identidade prévia do referente mulher a ser representado e, contraditoriamente, obriga a um fechamento no lugar onde se quer reivindicar abertura.” (tem um contexto maior, que você pode acessar aqui http://goo.gl/yd7xiM)

Tudo isso para demonstrar um nó que surgiu nas pesquisas que, muitas vezes, não conseguimos resolver sem colocar a questão mais genérica na roda. Como abordar o feminismo em nossas atividades? Que tipo de luta feminista nos propomos? Quais aspectos são importantes e que não podemos esquecer?

Não queremos uma resposta certa às perguntas, mas fazer com que ideias possam surgir enquanto nos conhecemos e nos desfrutamos como conjunto em volta a uma mesa de jantar.

E para ainda colocar em questão também quem deve comandar a cozinha (cozinhar para dentro X cozinhar para fora), convidamos a Comida de Papel, comandada pela querida cozinheira Pipa, para tocar o incrível menu:

Gaspacho de pepino e abacate
Ovos recheados
pão sírio integral

Salada de lentilha, beringela, cebola roxa e tomate seco
Salada de Beterrabas assadas com mexerica coentro e hortelã e molho de chá preto
Bolo de arroz com taioba, abóbora, semente de girassol e parmesão. com molho de iogurte

Sagú de erva cidreira com mel
Chá gelado de hibisco e casca de laranja.